Infinito Manu




“Manoela o seu texto ficou muito bom, vou publicá-lo na revista oficial. Quanto aos demais, aguardem para a próxima edição.”
Eu não puder conter de alegria, dentro de mim estava uma imensa gratidão pelo meu texto ter sido reconhecido, eu havia produzido sozinha e uns vinte minutos antes da entrega. Ao sair daquela sala os meus colegas viam um sorriso nos meus lábios. Eu fui comer e após isso passara em frente ao laboratório quando ouvi um grupo de colegas falarem de mim.
- É sempre ela, nós também produzimos um bom texto, fizemos o nosso melhor. Será que o nosso texto estava tão ruim assim? Nem feedback recebemos.
- É verdade, é sempre a “Manu”. A Manu sempre ganhara as coisas. Eu me esforço muito para conciliar faculdade e trabalho duro, enquanto ela leva tudo de graça.
- Eu tenho que pagar dois mil de mensalidade na faculdade, trabalho árduo também, já ela estuda na federal e ainda sempre fica na frente dos nerd quando quer. No serviço sempre leva vantagens.
- Eu também não aguento mais essa menina, nem vou falar mais com ela.
- Eu vejo muita coisa errada nisso, estão ajudando ela a ganhar.
- Vocês não sabem? A Manu é a filha da reitora.
- O que????? De onde você tirou isso?
- Que absurdo é esse?
- Não é nenhum absurdo, é a verdade. Eu fui na secretaria pedir minha rematrícula para uma nova disciplina. A secretária estava com muitos papéis em cima da mesa de diversos alunos, eu vi a ficha da Manu e consegui ler a parte de filiação no cadastro dela.
- Ela nunca comentou com ninguém aqui, deve ser porque isso é vantajoso para ela. Em todo tempo ela ouve as pessoas falando sobre as necessidades e sobre os problemas que estão tendo e ela nem sequer comentou com nenhum de nós.
- Ela pode ser filha de quem ela for. Eu acho ela muito chata, ela fala de assuntos que ninguém entende, está sempre falando daqueles malditos textos que sempre são premiados ou tira a nota máxima enquanto nós quase reprovamos ou reprovamos todo o semestre. Eu a detesto.
- No fundo ela nem é tão inteligente. A única coisa que ela tem são pessoas puxa-saco que a colocam em destaque.
Fui ao banheiro, tranquei a porta, chorei amargamente e na fúria derrubei tudo o que havia na pia do banheiro ao chão, eu sentia um ódio tão grande dentro de mim. Não havia motivos concretos para aqueles infelizes proferirem tamanhas barbaridades ao meu respeito. Eu havia me dedicado muito, contei-lhes diversas vezes do quanto abdicara para estar naquele lugar, ao invés de me compreenderem estavam contra mim.
Joguei uma água no meu rosto, peguei os objetos do chão, coloquei todos no lugar e com os olhos vermelhos sai. Após sair deparei-me com a primeira falsidade parabenizando-me pela conquista.
- Nossa, os seus olhos estão vermelhos, andou chorando?
- Chorei sim, chorei de alegria e emoção pela grande conquista.
- É muito bom, você é excelente no que faz, terá um futuro brilhante. Estou torcendo por você.
- Obrigada, eu desejo tudo em dobro para você. Eu sei que aquilo que desejamos aos outros nos retorna multiplicado, como você tem bons desejos isso será maior para ti.
Ela ficou sem graça, um sorriso amarelado apareceu em seu rosto, seus olhos se arregalaram, não proferiu alguma palavra, apenas balançou a cabeça e saiu. Os outros que falaram mal de mim também me cumprimentaram. Outrora fazendo certo desdém, outrora fazendo alguma observação maldosa. Eu mantive-me forte e decidida.
 “Queremos parabenizar a senhorita Manoela Fabbri por sua menção honrosa e pela publicação do seu artigo literário sobre a obra de Willian Shakespeare que será destaque na primeira página da edição da nossa revista científica.”
No final da apresentação dos autores que foram selecionados pela revista, nenhum dos outros que eram meus colegas conseguiram aprovação. Aquilo não dependia de mim, era uma comissão de profissionais especialistas que selecionavam os candidatos, nem mesmo o nosso nome era revelado antes da seleção final. Após terminar aquele evento, uma colega veio até mim despejar toda raiva e frustração.
- Nós já sabemos de tudo. Não adianta mais tentar esconder que todos sabem que você é a filha da reitora. ELA É A FILHA DA REITORA.   Eu vou continuar gritando isso alto até que todos ouçam que você não é tão inteligente e sim indicada e protegida. E o seu pai Manu, quem é o seu pai?
- Você é louca Letícia. De onde você tirou essas informações?
- Eu, louca? Jamais, estou lúcida, e agora mais lúcida ainda. Por que você tentou esconder sua família Manu? Você pensou que iria poder esconder uma família tão lustre como a sua. Filha da elite intelectual da cidade, seria muita coincidência, justo você ganhar tudo. Filha de reitora, pai cientista, irmã arqueóloga, tio astronauta.
- Por que você não fala da sua família Letícia? Seus pais são comerciantes, você não vê nobreza nisso? Ou você só vê a inveja por aquilo que não lutou para conquistar. Eu não estou aqui por causa de ninguém da minha família, eles nem sequer sabem que eu escrevo ou muito menos que faço faculdade de literatura. O que te deixa frustrada não é de onde eu venho, é quem eu sou. De onde eu venho tem muitos outros por aqui, essa é uma instituição privada. Agora quem eu sou, não é todo mundo que pode ser.
Ao dizer essas palavras eu quebrei ela por dentro, não foi algo premeditado, apenas fluiu no momento. Me retirei do auditório, deixei ela ali sozinha com seus pensamentos, comecei a caminhar pelo campus, bem longe no meio da natureza havia uma praça estudantil, sentei me sozinha e as lágrimas vieram. Apenas deixei as lágrimas rolarem, sem palavras e a garganta seca, eu engolia em seco e não podia fazer nada.
- Manoela, por que está chorando?
- Você nunca viu uma mulher chorar não?
- Eu já vi mulher chorar, eu nunca tinha visto a Manoela chorar. Não é qualquer mulher.
- Você é idiota, eu prefiro o silêncio para poder chorar em paz.
- Não se tem paz em um lugar desses. Venha, pegue minha mão. Você sempre foi forte demais para ficar chorando desse jeito.
- Guilherme, se não fosse você não seria outro.
- Não permito que me chame de Guilherme. Para você eu sou sempre o Gui.
- Sem-vergonha...rsrsrsr


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